sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Saramago: democracia e comunismo

Posted by Revista Presença Lusitana | sexta-feira, 5 de novembro de 2010 | Category: |

O comunismo real, acabou. Foi embora. Ficam por aí alguns países que aguentam a grande pressão das organizações internacionais e as fragilidades próprias dos seus sistemas políticos (da China nem falarmos: um dragão gigante capitalista disfarçado de vermelho). As grandes ditaduras supostamente baseadas nas ideias e nos fundamentos do marxismo encarregaram-se de matar toda ilusão de mudança no coração da gente.
 
Porém, ainda fica o comunismo utópico, aquele que mora na nossa cabeça mantendo viva a esperança de uma realidade melhor, com maior justiça, verdadeiramente democrática; um comunismo como aquele com que sonhava o senhor José Saramago.

As convicções políticas do grande escritor português sempre foram claras, sua relação com o Patido Comunista do seu país foi firme, mesmo que o espírito crítico do Saramago brigou algumas vezes contra a postura fechada, hermética ou ortodoxa dos líderes. Os princípios e os valores não mudam; o Nobel defendeu sempre a tendência da Esquerda, como mostram estas palavras feitas para um folheto eleitoral:
 
“Temos razão, a razão que assiste a quem propõe que se construa um mundo melhor antes de que seja demasiado tarde(...)Se o mundo alguma vez conseguir ser melhor, só o terá sido por nós e connosco. Sejamos mais conscientes e orgulhemo-nos do nosso papel na História”.

Saramago sempre compreendeu os grandes erros dos regimes que diziam ser comunistas, ao igual do que entendeu com lucidez admirável os problemas deste mundo moderno que acredita ser perfeito:

“Não se repara que, a democracia em que vivemos é uma democracia sequestrada, condicionada, amputada (...) porque as grandes decisões são tomadas numa outra esfera, e todos sabemos qual é: as organizações finacieiras internacionais; nenhum desses organismos é democrático”.

Aqueles que criticavam a ideologia do Saramago, apontavam continuamente os enormes desastres das nações comunistas, tentando se calhar encontrar culpas naqueles intelectuais defensores desse sistema. Numa ocasião alguém lhe perguntou:

“Por que você, depois da União Sovietica e o derrubamento do Muro de Berlim, da invasão da Hungria e tudo isso, continua a ser comunista?”  e ele perguntou, para seguir na mesma linha: e você que é católico, depois da inquisição como é que continua a acreditar? Demonstrando que o importante é ter uma crença e uma maneira de pensar, mesmo que as instituções terrenais que dizem representá-la  sejam traiçoeiras.

As certezas estão a viver no nosso sangue, elas fazem-nos o que realmente somos perante a gente, definem nossa exitência no mundo e não as podemos negar. Assim o disse o autor:

“Eu sou aquilo que se poderia chamar um comunista hormonal; da mesma maneira que eu tenho no corpo uma hormona que me faz crescer a barba, há outra hormona que me obriga (mesmo que não quissese) por uma espécie de fatalidade biológica a ser comunista”.

Mas o modo mais belo que José Saramago teve para explicar sua posição, resume-se em sete simples palavras: “Ser comunista é um estado do Espírito”.

Sim, o comunismo real acabou. Foi embora. E provavelmente seja melhor, como sugeriu Saramago, viver com um Espírito comunista, e não seguir como agora, sumidos num capitalismo carente dele.

Jorge Mtz. Palafox.

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