sexta-feira, 5 de novembro de 2010

D. Sebastião I e o Sebastianismo

Posted by Revista Presença Lusitana | sexta-feira, 5 de novembro de 2010 | Category: |

A esperança de um futuro melhor sempre existiu na raça humana. Diversas civilizações ao longo do tempo criaram lendas ou mitos com a finalidade de  justificarem a sua existência no mundo ou para trabalhar em pró do seu futuro. Se calhar esta aproximação à definição de mito e de lenda não seja exacta, mas com a seguinte história de D. Sebastião I de Portugal pode-se observar o que cria um mito na sociedade.

A 20 de Janeiro de 1554 nasceu um rei em Lisboa, um monarca tão esperado pela sociedade portuguesa. Foi conhecido como “O Desejado” porque o poeta António Gonçalves Annes Bandarra, ou simplesmente Barranda, escrevera diversos cânticos e poemas nos quais profetizava a chegada de um príncipe bom, capaz de salvar o país e criar o reino de Deus na terra. Além destas ideia messiânica, o filho de D. João e D. Joana de Áustria, segurava o trono à Dinastia de Avis e, portanto a independência do reino de Portugal.
 
O seu pai morreu duas semanas antes do seu nascimento e quando seu avô, D. João III, faleceu em 1557, D. Sebastião tornou-se  herdeiro ao trono com apenas três anos de idade. Como regentes ficam primeiro a sua avó a rainha Catarina da Áustria e depois o seu tio-avô, o Cardeal Henrique de Évora. As ideias que o mesmo povo lhe adjudicava formam uma criança com espírito guerreiro, com vontade de continuar a grandeza do reino, mas sobretudo de recuperar para a cristandade o Império Marroquino.
 
À idade de 14 anos por fim D. Sebastião assumiu o trono. O jovem rei queria empreender uma cruzada contra os mouros e converter-se nesse herói tão desejado pela sociedade portuguesa. Em 1578 o exército português chegou a Marrocos e empreenderam o rumo à cidade de Fez -  no centro-norte do país. Mas os sonhos de grandeza do rei de apenas 24 anos viram-se quebrados na batalha de Alcácer-Quibir.

O exército português, esfomeado e estafado pela marcha e pelo calor, enfrentou as forças marroquinas. Diz-se que o exército todo morreu ou ficou cativo e somente houve quatro fugitivos, mas a única certeza é que ninguém fala sobre a morte do rei. O corpo de D. Sebastião não foi visto pelos sobreviventes - sejam quatro ou mais - e portanto foi quando o sebastianismo se originou.

Com a ausência do rei, Portugal entraria num colapso político, porque não havia um herdeiro ao trono luso. Perante esta situação, em 1580 o reinado português estaria nas mãos da Espanha, sob a anexação ao reino de Castela - de 1580 a 1646.  É um dos episódios mais negros da história portuguesa porque existia a possibilidade da desaparição do velho Portugal, mas, na sociedade portuguesa começaria a tomar força o sebastianismo: a crença do retorno do rei-jovem, do «Desejado» que iria terminar com a opressão, o sofrimento e a miséria e revelando amargura para o futuro e melancolia ao relembrar o passado.

O mito de D. Sebastião foi a pequena esperança de todo um povo para continuar a existir. Além do território dividido e dos problemas todos pelos quais estavam a passar, os portugueses tinham fé no retorno do rei, a única pessoa que com sua chegada traria a grandeza do passado e talvez essa pequena luz, foi o motivo principal para que continuasse a existir Portugal. 

Felipe I de Portugal em 1582 mandou trasladar o suposto corpo de D. Sebastião para o Mosteiro dos Jerónimos em Lisboa. A sua finalidade era acabar com o sebastianismo, mas falhou porque nunca se comprovou se o corpo era em verdade de Sebastião I. O túmulo de mármore que repousa sobre dois elefantes, ainda está na capital.

Ver um túmulo e não acreditar nele. Ver um passado e senti-lo perto. Como poderíamos experimentar esse sentimento? Se calhar um dia, o dia não esperado, o dia do desejado possamos senti-lo. Ver o rei-jovem, o rei-menino aparecer num dia de bruma e nevoeiro é o que os sebastianistas esperam, mas pelo momento a esperança faz o seu trabalho que com o passo do tempo converte-nos em D. Sebastião I, rei de Portugal. 

A alma é imortal, e se desaparece, torna a aparecer onde é evocada através da sua forma. Assim, morto D. Sebastião, o corpo, se conseguirmos evocar qualquer coisa em nós que se assemelha à forma do esforço de D. Sebastião, ipso facto o teremos evocado e a alma dele entrará para a forma que evocamos. Por isso, quando houverdes criado uma coisa cuja forma seja idêntica à do pensamento de D. Sebastião, D. Sebastião terá regressado.
(Fernando Pessoa. Portugal, Sebastianismo e Quinto Império)
 
«O sebastianismo incorporou-se na produção literária, tendo como seus veiculadores o padre Antônio Vieira (1608-1697) e, na literatura contemporânea portuguesa, o poeta Fernando Pessoa (1888-1935). De Portugal, o sebastianismo também repercutiu no Brasil. O movimento que teve como líder Antônio Conselheiro, ocorrido no sertão baiano, cujo conflito, a Guerra de Canudos (1895-1897), foi descrito em Os Sertões, de Euclides da Cunha, também teve traços do sebastianismo.»

Gustavo Y.

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